Dissecando o conflito de interesses na administração pública

June 27, 2023

Hoje, após ler um artigo de autoria do brilhante jurista Wálter Maierovitch, não pude deixar de olhar com descrédito para a forma como uma parte das autoridades acaba lidando com conflitos de interesses.

Embora conflitos de interesses possam ter acepções diversas dependendo de sua natureza, em linguagem simples e no âmbito da administração pública significam as hipóteses em que um funcionário público (seja servidor público ou funcionário público celetista) prioriza um interesse secundário, geralmente de natureza pessoal, em detrimento do interesse primário, que é o exercício lídimo e escorreito da sua função pública.

A subjetividade é a maior dificuldade ao lidar com conflito de interesses , a qual, em muitos casos, fica a critério exclusivo da própria autoridade. Isso sem qualquer validação por parte de Comissão de Ética interna do órgão, autarquia ou fundação, da Comissão de Ética Pública (CEP) ou da Controladoria Geral da União (CGU) em decidir se o conflito de interesses existe ou não e se o mesmo impede o resultado de determinada iniciativa.

A despeito da ideologia partidária no poder, a CEP, em 25 de setembro de 2003, editou a Resolução nº 08, de forma a identificar situações que suscitariam conflito de interesses, dispondo ainda sobre o modo de preveni-los. Dessa forma, elencou inicialmente como suscitadoras de conflito de interesses as atividades que:

RESOLUÇÃO CEP Nº 08 DE 25.09.2003 – ATIVIDADES QUE SUSCITARIAM CONFLITO DE INTERESSES

1. em razão da sua natureza, seja incompatível com as atribuições do cargo ou função pública da autoridade, como tal considerada, inclusive, a atividade desenvolvida em áreas ou matérias afins à competência funcional;

2. viole o princípio da integral dedicação pelo ocupante de cargo em comissão ou função de confiança, que exige a precedência das atribuições do cargo ou função pública sobre quaisquer outras atividades;

3. implique a prestação de serviços a pessoa física ou jurídica ou a manutenção de vínculo de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão individual ou coletiva da autoridade;

4. possa, pela sua natureza, implicar o uso de informação à qual a autoridade tenha acesso em razão do cargo e não seja de conhecimento público;

5. possa transmitir à opinião pública dúvida a respeito da integridade, moralidade, clareza de posições e decoro da autoridade.

Além disso, de forma absolutamente pertinente, a CEP deixou claro que o conflito de interesses independe do recebimento de qualquer ganho ou retribuição pela autoridade. Essa prerrogativa, por si só, já tornaria ilegal diversas iniciativas suscitadas por algumas autoridades, ao invés de tais iniciativas levantarem suspeitas de qualquer irregularidade.

A CEP ainda teve a cautela de elencar as formas da autoridade prevenir a ocorrência do conflito de interesses ao adotar uma ou mais dentre as seguintes previdências:

RESOLUÇÃO CEP Nº 08 DE 25.09.2003 – FORMAS DE PREVENÇÃO DO CONFLITO DE INTERESSES

1. abrir mão da atividade ou licenciar-se do cargo, enquanto perdurar a situação passível de suscitar conflito de interesses;

2. alienar bens e direitos que integram o seu patrimônio e cuja manutenção possa suscitar conflito de interesses;

3. transferir a administração dos bens e direitos que possam suscitar conflito de interesses a instituição financeira ou a administradora de carteira de valores mobiliários autorizada a funcionar pelo Banco Central ou pela Comissão de Valores Mobiliários, conforme o caso, mediante instrumento contratual que contenha cláusula que vede a participação da autoridade em qualquer decisão de investimento assim como o seu prévio conhecimento de decisões da instituição administradora quanto à gestão dos bens e direitos;

4. na hipótese de conflito de interesses específico e transitório, comunicar sua ocorrência ao superior hierárquico ou aos demais membros de órgão colegiado de que faça parte a autoridade, em se tratando de decisão coletiva, abstendo-se de votar ou participar da discussão do assunto;

5. divulgar publicamente sua agenda de compromissos, com identificação das atividades que não sejam decorrência do cargo ou função pública.

Finalmente, a CEP estabelece que a mesma deveria ser informada pela autoridade e que opinaria a respeito da suficiência da medida adotada. Entretanto, tal dispositivo aparenta ser letra morta.Eis que seguindo uma onda de moralidade que começava a varrer o Brasil, o Congresso Nacional editou a Lei nº 12.813, em 16 de maio de 2013, denominada de Lei de Conflito de Interesses, que listou as seguintes hipóteses de conflito de interesses, estando a autoridade no exercício do cargo ou emprego público ou após o exercício do cargo ou emprego público, no âmbito do Poder Executivo federal. Vejamos primeiramente as hipóteses com a autoridade no exercício do cargo ou emprego público:

LEI Nº 12.813/2013 – HIPÓTESES DE CONFLITO DE INTERESSES COM A AUTORIDADE NO EXERCÍCIO DO CARGO

1. divulgar ou fazer uso de informação privilegiada, em proveito próprio ou de terceiro, obtida em razão das atividades exercidas;

2. exercer atividade que implique a prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe;

3. exercer, direta ou indiretamente, atividade que em razão da sua natureza seja incompatível com as atribuições do cargo ou emprego, considerando-se como tal, inclusive, a atividade desenvolvida em áreas ou matérias correlatas;

4. atuar, ainda que informalmente, como procurador, consultor, assessor ou intermediário de interesses privados nos órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

5. praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e que possa ser por ele beneficiada ou influir em seus atos de gestão;

6. receber presente de quem tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe fora dos limites e condições estabelecidos em regulamento; e

7. prestar serviços, ainda que eventuais, a empresa cuja atividade seja controlada, fiscalizada ou regulada pelo ente ao qual o agente público está vinculado.

Agora, as demais hipóteses que configuram conflito de interesses com a autoridade após o exercício de cargo ou emprego público:

LEI Nº 12.813/2013 – HIPÓTESES DE CONFLITO DE INTERESSES COM A AUTORIDADE APÓS O EXERCÍCIO DO CARGO

1. a qualquer tempo, divulgar ou fazer uso de informação privilegiada obtida em razão das atividades exercidas; e

2. no período de 6 (seis) meses, contado da data da dispensa, exoneração, destituição, demissão ou aposentadoria, salvo quando expressamente autorizado, conforme o caso, pela Comissão de Ética Pública ou pela Controladoria-Geral da União: a) prestar, direta ou indiretamente, qualquer tipo de serviço a pessoa física ou jurídica com quem tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do exercício do cargo ou emprego; b) aceitar cargo de administrador ou conselheiro ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que desempenhe atividade relacionada à área de competência do cargo ou emprego ocupado; c) celebrar com órgãos ou entidades do Poder Executivo federal contratos de serviço, consultoria, assessoramento ou atividades similares, vinculados, ainda que indiretamente, ao órgão ou entidade em que tenha ocupado o cargo ou emprego; ou d) intervir, direta ou indiretamente, em favor de interesse privado perante órgão ou entidade em que haja ocupado cargo ou emprego ou com o qual tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do exercício do cargo ou emprego.

Aperfeiçoando ainda o que fora disposto na Resolução nº 08 da CEP, a lei esclareceu que a ocorrência de conflito de interesses independeria da existência de lesão ao patrimônio público, bem como do recebimento de qualquer vantagem ou ganho pelo agente público ou por terceiro.

É importante, no entanto, deixar claro as limitações do alcance dessa lei, listadas abaixo:

LEI Nº 12.813/2013 – LIMITAÇÕES DA LEI

1. Submetem-se ao regime desta Lei os ocupantes dos seguintes cargos e empregos: a. ministro de Estado; b. de natureza especial ou equivalentes; c. presidente, vice-presidente e diretor, ou equivalentes, de autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista;

d. Grupo-Direção e Assessoramento Superiores – DAS, níveis 6 e 5 ou equivalentes; e e.

ocupantes de cargos ou empregos cujo exercício proporcione acesso a informação privilegiada capaz de trazer vantagem econômica ou financeira para o agente público ou para terceiro, conforme definido em regulamento.

2. Âmbito apenas do Poder Executivo federal.

3. Compete à CEP, devido aos cargos atingidos e residualmente às CGU, estabelecer normas, avaliar e fiscalizar a ocorrência, orientar e dirimir dúvidas, manifestar-se sobre a existência ou não, autorizar o exercício de atividade privada, dispor sobre comunicação de alterações patrimoniais e fiscalizar a divulgação de agenda.

Já no âmbito do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução 125, de 29 de novembro de 2010, que dispôs sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. O conteúdo da qual é assaz decepcionante, uma vez que sequer estabelece a definição e os critérios para tornar o menos subjetivo possível à idiossincrasia do julgador acerca do que é ou não conflito de interesses, além da validação compulsória por parte de um colegiado. A solução de controvérsias proposta na resolução, com conciliadores e mediadores, coordenadores de núcleos e câmaras, é ineficaz sem tal definição e critérios acima descritos. Aliás, diga-se de passagem, a norma parece focar no conflito de interesses entre partes litigantes, não tendo qualquer eficácia na regulação de conflitos de interesses eventualmente experimentadas por partes judicantes.

O fato é que apesar de a maior parte das empresas possuírem normas internas de gerenciamento de situações ligadas a conflito de interesses real, potencial ou aparente, o mesmo não se pode dizer da Administração Pública, especialmente no caso de conflito de interesses aparente, com o qual não parece haver qualquer preocupação.

Não há dúvidas que a questão do conflito de interesses precisa ser aperfeiçoada no âmbito dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Regras, definições e critérios claros, além de medidas disciplinares eficientes, evitariam abusos por parte de algumas autoridades e seriam muito bem-vindas para blindar o setor público de abusos do setor privado.

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Embora conflitos de interesses possam ter acepções diversas dependendo de sua natureza, em linguagem simples e no âmbito da administração pública significam as hipóteses em que um funcionário público (seja servidor público ou funcionário público celetista) prioriza um interesse secundário, geralmente de natureza pessoal, em detrimento do interesse primário, que é o exercício lídimo e escorreito da sua função pública.

A subjetividade é a maior dificuldade ao lidar com conflito de interesses , a qual, em muitos casos, fica a critério exclusivo da própria autoridade. Isso sem qualquer validação por parte de Comissão de Ética interna do órgão, autarquia ou fundação, da Comissão de Ética Pública (CEP) ou da Controladoria Geral da União (CGU) em decidir se o conflito de interesses existe ou não e se o mesmo impede o resultado de determinada iniciativa.

A despeito da ideologia partidária no poder, a CEP, em 25 de setembro de 2003, editou a Resolução nº 08, de forma a identificar situações que suscitariam conflito de interesses, dispondo ainda sobre o modo de preveni-los. Dessa forma, elencou inicialmente como suscitadoras de conflito de interesses as atividades que:

RESOLUÇÃO CEP Nº 08 DE 25.09.2003 – ATIVIDADES QUE SUSCITARIAM CONFLITO DE INTERESSES

1. em razão da sua natureza, seja incompatível com as atribuições do cargo ou função pública da autoridade, como tal considerada, inclusive, a atividade desenvolvida em áreas ou matérias afins à competência funcional;

2. viole o princípio da integral dedicação pelo ocupante de cargo em comissão ou função de confiança, que exige a precedência das atribuições do cargo ou função pública sobre quaisquer outras atividades;

3. implique a prestação de serviços a pessoa física ou jurídica ou a manutenção de vínculo de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão individual ou coletiva da autoridade;

4. possa, pela sua natureza, implicar o uso de informação à qual a autoridade tenha acesso em razão do cargo e não seja de conhecimento público;

5. possa transmitir à opinião pública dúvida a respeito da integridade, moralidade, clareza de posições e decoro da autoridade.

Além disso, de forma absolutamente pertinente, a CEP deixou claro que o conflito de interesses independe do recebimento de qualquer ganho ou retribuição pela autoridade. Essa prerrogativa, por si só, já tornaria ilegal diversas iniciativas suscitadas por algumas autoridades, ao invés de tais iniciativas levantarem suspeitas de qualquer irregularidade.

A CEP ainda teve a cautela de elencar as formas da autoridade prevenir a ocorrência do conflito de interesses ao adotar uma ou mais dentre as seguintes previdências:

RESOLUÇÃO CEP Nº 08 DE 25.09.2003 – FORMAS DE PREVENÇÃO DO CONFLITO DE INTERESSES

1. abrir mão da atividade ou licenciar-se do cargo, enquanto perdurar a situação passível de suscitar conflito de interesses;

2. alienar bens e direitos que integram o seu patrimônio e cuja manutenção possa suscitar conflito de interesses;

3. transferir a administração dos bens e direitos que possam suscitar conflito de interesses a instituição financeira ou a administradora de carteira de valores mobiliários autorizada a funcionar pelo Banco Central ou pela Comissão de Valores Mobiliários, conforme o caso, mediante instrumento contratual que contenha cláusula que vede a participação da autoridade em qualquer decisão de investimento assim como o seu prévio conhecimento de decisões da instituição administradora quanto à gestão dos bens e direitos;

4. na hipótese de conflito de interesses específico e transitório, comunicar sua ocorrência ao superior hierárquico ou aos demais membros de órgão colegiado de que faça parte a autoridade, em se tratando de decisão coletiva, abstendo-se de votar ou participar da discussão do assunto;

5. divulgar publicamente sua agenda de compromissos, com identificação das atividades que não sejam decorrência do cargo ou função pública.

Finalmente, a CEP estabelece que a mesma deveria ser informada pela autoridade e que opinaria a respeito da suficiência da medida adotada. Entretanto, tal dispositivo aparenta ser letra morta.Eis que seguindo uma onda de moralidade que começava a varrer o Brasil, o Congresso Nacional editou a Lei nº 12.813, em 16 de maio de 2013, denominada de Lei de Conflito de Interesses, que listou as seguintes hipóteses de conflito de interesses, estando a autoridade no exercício do cargo ou emprego público ou após o exercício do cargo ou emprego público, no âmbito do Poder Executivo federal. Vejamos primeiramente as hipóteses com a autoridade no exercício do cargo ou emprego público:

LEI Nº 12.813/2013 – HIPÓTESES DE CONFLITO DE INTERESSES COM A AUTORIDADE NO EXERCÍCIO DO CARGO

1. divulgar ou fazer uso de informação privilegiada, em proveito próprio ou de terceiro, obtida em razão das atividades exercidas;

2. exercer atividade que implique a prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe;

3. exercer, direta ou indiretamente, atividade que em razão da sua natureza seja incompatível com as atribuições do cargo ou emprego, considerando-se como tal, inclusive, a atividade desenvolvida em áreas ou matérias correlatas;

4. atuar, ainda que informalmente, como procurador, consultor, assessor ou intermediário de interesses privados nos órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

5. praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e que possa ser por ele beneficiada ou influir em seus atos de gestão;

6. receber presente de quem tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe fora dos limites e condições estabelecidos em regulamento; e

7. prestar serviços, ainda que eventuais, a empresa cuja atividade seja controlada, fiscalizada ou regulada pelo ente ao qual o agente público está vinculado.

Agora, as demais hipóteses que configuram conflito de interesses com a autoridade após o exercício de cargo ou emprego público:

LEI Nº 12.813/2013 – HIPÓTESES DE CONFLITO DE INTERESSES COM A AUTORIDADE APÓS O EXERCÍCIO DO CARGO

1. a qualquer tempo, divulgar ou fazer uso de informação privilegiada obtida em razão das atividades exercidas; e

2. no período de 6 (seis) meses, contado da data da dispensa, exoneração, destituição, demissão ou aposentadoria, salvo quando expressamente autorizado, conforme o caso, pela Comissão de Ética Pública ou pela Controladoria-Geral da União: a) prestar, direta ou indiretamente, qualquer tipo de serviço a pessoa física ou jurídica com quem tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do exercício do cargo ou emprego; b) aceitar cargo de administrador ou conselheiro ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que desempenhe atividade relacionada à área de competência do cargo ou emprego ocupado; c) celebrar com órgãos ou entidades do Poder Executivo federal contratos de serviço, consultoria, assessoramento ou atividades similares, vinculados, ainda que indiretamente, ao órgão ou entidade em que tenha ocupado o cargo ou emprego; ou d) intervir, direta ou indiretamente, em favor de interesse privado perante órgão ou entidade em que haja ocupado cargo ou emprego ou com o qual tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do exercício do cargo ou emprego.

Aperfeiçoando ainda o que fora disposto na Resolução nº 08 da CEP, a lei esclareceu que a ocorrência de conflito de interesses independeria da existência de lesão ao patrimônio público, bem como do recebimento de qualquer vantagem ou ganho pelo agente público ou por terceiro.

É importante, no entanto, deixar claro as limitações do alcance dessa lei, listadas abaixo:

LEI Nº 12.813/2013 – LIMITAÇÕES DA LEI

1. Submetem-se ao regime desta Lei os ocupantes dos seguintes cargos e empregos: a. ministro de Estado; b. de natureza especial ou equivalentes; c. presidente, vice-presidente e diretor, ou equivalentes, de autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista;

d. Grupo-Direção e Assessoramento Superiores – DAS, níveis 6 e 5 ou equivalentes; e e.

ocupantes de cargos ou empregos cujo exercício proporcione acesso a informação privilegiada capaz de trazer vantagem econômica ou financeira para o agente público ou para terceiro, conforme definido em regulamento.

2. Âmbito apenas do Poder Executivo federal.

3. Compete à CEP, devido aos cargos atingidos e residualmente às CGU, estabelecer normas, avaliar e fiscalizar a ocorrência, orientar e dirimir dúvidas, manifestar-se sobre a existência ou não, autorizar o exercício de atividade privada, dispor sobre comunicação de alterações patrimoniais e fiscalizar a divulgação de agenda.

Já no âmbito do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução 125, de 29 de novembro de 2010, que dispôs sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. O conteúdo da qual é assaz decepcionante, uma vez que sequer estabelece a definição e os critérios para tornar o menos subjetivo possível à idiossincrasia do julgador acerca do que é ou não conflito de interesses, além da validação compulsória por parte de um colegiado. A solução de controvérsias proposta na resolução, com conciliadores e mediadores, coordenadores de núcleos e câmaras, é ineficaz sem tal definição e critérios acima descritos. Aliás, diga-se de passagem, a norma parece focar no conflito de interesses entre partes litigantes, não tendo qualquer eficácia na regulação de conflitos de interesses eventualmente experimentadas por partes judicantes.

O fato é que apesar de a maior parte das empresas possuírem normas internas de gerenciamento de situações ligadas a conflito de interesses real, potencial ou aparente, o mesmo não se pode dizer da Administração Pública, especialmente no caso de conflito de interesses aparente, com o qual não parece haver qualquer preocupação.

Não há dúvidas que a questão do conflito de interesses precisa ser aperfeiçoada no âmbito dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Regras, definições e critérios claros, além de medidas disciplinares eficientes, evitariam abusos por parte de algumas autoridades e seriam muito bem-vindas para blindar o setor público de abusos do setor privado.

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