Superior Tribunal de Justiça ratifica a responsabilidade solidária na lei anticorrupção

September 1, 2025

A Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013) representou um marco fundamental no combate à corrupção no Brasil ao estabelecer, entre outros ponto, a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas por atos lesivos contra a administração pública.

Um dos temas mais relevantes e debatidos a respeito dessa legislação tem sido a extensão da responsabilidade, especialmente no se refere à solidariedade entre empresas integrantes de um mesmo grupo econômico.

Em 3 de junho desse ano, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou e consolidou o entendimento sobre a aplicação irrestrita da responsabilidade solidária prevista no art. 4º, § 2º, da referida lei. O julgamento, de grande relevância, eliminou quaisquer divergências de interpretação acerca dessa questão. Esse entendimento foi firmado por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 2.209.077-RS, de relatoria do Ministro Paulo Sérgio Domingues, cujos detalhes serão apresentados abaixo.

1. Contextualização do julgamento

O julgamento em questão da Primeira Turma do STJ teve como resultado um acórdão que consolidou a negativa de provimento ao Recurso Especial interposto por SUL CONCESSOES RODOVIARIAS S/A. Com efeito, a decisão confirmou a validade das disposições da Lei Anticorrupção relativas à responsabilidade solidária entre sociedades controladoras, controladas, coligadas e consorciadas, conforme expressamente declarado na ementa do julgado:

EMENTA “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 1.022 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 4º, § 2º, DA LEI ANTICORRUPÇÃO (LEI 12.846/2013). INTERPRETAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO NEGADO.”

A corte superior manteve, portanto, a tese de que a responsabilidade por atos lesivos à administração pública, no âmbito da Lei Anticorrupção, abrange de forma ampla as relações societárias. Isso visa impedir a blindagem patrimonial entre empresas de um mesmo grupo econômico e a evasão de responsabilização.

O cerne do Recurso Especial interposto por SUL CONCESSOES RODOVIARIAS S/A residia na alegação de violação ao art. 1.022, I, do Código de Processo Civil (CPC), por suposta obscuridade do acórdão recorrido do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) quanto à interpretação do art. 4º, § 2º, da Lei Anticorrupção. A recorrente sustentou que a responsabilidade solidária não deveria ser aplicada de forma ampla e irrestrita, argumentando que o caput do art. 4º da Lei Anticorrupção condicionaria a solidariedade à ocorrência de modificações societárias (como alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária).

A manifestação da recorrente é explicitada no relatório do voto: “Sustenta que houve ofensa ao art. 11, III, da Lei Complementar 95/1998 e ao art. 4º, § 2º, da Lei 12.846/2013, ao argumento de que a responsabilidade solidária não deve ser aplicada de forma ampla e irrestrita, pois o caput do art. 4º condiciona a solidariedade à ocorrência de modificações societárias.”

O STJ, contudo, rechaçou os argumentos da recorrente. Primeiramente, afastou a alegada violação ao art. 1.022 do CPC, asseverando que a prestação jurisdicional foi adequadamente entregue e o acórdão do TRF4 não padecia de vícios. Em relação ao mérito, o Tribunal enfatizou que a interpretação do art. 4º, § 2º, da Lei Anticorrupção deve ser teleológica, buscando efetivar o propósito da norma de evitar que pessoas jurídicas se esquivem de suas responsabilidades mediante artifícios legais ou reestruturações societárias.

2. Validação da interpretação do art. 4, § 2 da Lei Anticorrupção

A Lei nº 12.846/2013 prevê no seu art. 4º e no respectivo parágrafo segundo o seguinte:

Artigo Quarto e Parágrafo Segundo

Art. 4º Subsiste a responsabilidade da pessoa jurídica na hipótese de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária.

§ 2º As sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato, as consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei, restringindo-se tal responsabilidade à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado.

O STJ, corroborando o entendimento do TRF4, esclareceu que o caput do art. 4º não estabelece uma condição para a atribuição da responsabilidade solidária. Pelo contrário, o dispositivo visa garantir a continuidade da responsabilidade da pessoa jurídica mesmo diante de alterações societárias. Ou seja, a responsabilidade perdurará, ainda que ocorram transformações ou reorganizações empresariais, sem que estas sirvam como subterfúgio para eximir a entidade de suas obrigações.

A essência da interpretação do STJ reside na finalidade do § 2º do art. 4º, que é, segundo a Corte, a de “abranger o maior número de situações possíveis no âmbito da criação, da transformação, do agrupamento e da dissolução de empresas, impedindo, dessa forma, a ausência de responsabilização em decorrência de lacuna legislativa”. Tal entendimento busca, primordialmente, evitar que grupos econômicos se valham de suas complexas estruturas societárias para se furtar à responsabilização por atos ilícitos.

A referida decisão cita a doutrina a seguir: “Com o mesmo propósito já manifestado em outros artigos, a lei pretende aqui evitar que sejam excluídas de seu âmbito determinadas situações pela ausência de certas formalidades ou lacunas legais; no caso, a situação dos grupos econômicos.”  

O Tribunal de origem (TRF4), em trecho endossado pelo próprio STJ, foi ainda mais incisivo ao afirmar que: “Embora o caput e o §1º tratem de alterações promovidas na pessoa jurídica supervenientes ao estabelecimento de relação entre a sociedade privada e a Administração Pública, o §2º afirma, de maneira geral e ampla, que as sociedades controladoras, controladas, coligadas e consorciadas são responsáveis de forma solidária pelos atos previstos naquela lei. A intenção da norma é clara no sentido de evitar que os conglomerados empresariais furtem-se de responsabilidade.

Ademais, a decisão enfatiza que não importa a data de criação das pessoas jurídicas controladas ou coligadas, mas sim se os atos ilícitos ocorreram ou produziram efeitos durante a vigência da Lei Anticorrupção. Isso impede a proteção ad aeternum de empresas líderes de conglomerados que controlam pessoas jurídicas interpostas.

3. Implicações da decisão

A decisão do STJ tem implicações profundas para a responsabilidade corporativa. No caso concreto, o Tribunal manteve a inclusão de uma empresa com participação societária superior a 20% no capital social da concessionária — a qual era a responsável direta pelos atos lesivos — no polo passivo da ação embasada na Lei Anticorrupção. Esta inclusão se deu sob o fundamento de que a empresa se enquadrava na definição de “coligada” e, portanto, estava sujeita à responsabilidade solidária.

O acórdão do TRF4, ratificado pelo STJ, explicita a qualificação da empresa neste sentido: “Acerca do conceito de coligadas (…) E referido dispositivo caracteriza sociedade coligada aquela que é titular 10% (dez por cento) ou mais do capital da outra sociedade, sem controlá-la. No caso em apreço a agravante tem mais de 20% do capital social da concessionária.

Isso reforça que a simples existência de um vínculo societário significativo, nos moldes definidos pela legislação civil é suficiente para atrair a responsabilidade solidária na Lei Anticorrupção, independentemente da demonstração de que a empresa coligada tenha diretamente cometido ou contribuído para o cometimento dos ilícitos. Conforme o art. 1.099 do Código Civil, a coligação se caracteriza se houver participação de 10% ou mais do capital social. A lógica é que, ao integrar um conglomerado e ser beneficiada pelos atos, mesmo que de forma indireta, a empresa assume o risco inerente à associação.

Essa interpretação se alinha ao caráter objetivo da responsabilidade estabelecida pela Lei Anticorrupção e à sua finalidade de responsabilizar entidades que, embora não diretamente executoras do ato ilícito, integram um complexo societário que se beneficiou ou deveria ter evitado a prática lesiva. A tese de que a controladora ou coligada, por sua posição de proeminência, “concretamente contribuiu para o resultado final” ou “de alguma maneira foram beneficiadas por eventuais vantagens indevidas” é um fundamento importante, afastando a necessidade de uma participação direta no ato de corrupção em si, mas focando na responsabilidade pela gestão e benefícios do grupo como um todo.

Essa decisão é crucial por diversos motivos:

Combate à impunidade: Dificulta a utilização de reestruturações societárias e complexas teias empresariais para evadir a responsabilização por atos de corrupção.

Reforço da governança: Impõe um ônus maior às empresas que integram grupos econômicos, incentivando a implementação de programas de compliance robustos e mecanismos de due diligence eficazes em todas as suas filiadas e coligadas.

Alinhamento com a teleologia da lei: Garante que a finalidade da Lei Anticorrupção — que é a de responsabilizar objetivamente as pessoas jurídicas por atos lesivos contra a administração pública — seja plenamente atingida, sem lacunas que permitam escoimar-se à responsabilidade.

Para empresas que atuam em grupos econômicos, a mensagem é clara: a interconexão societária implica uma responsabilidade compartilhada. A simples participação significativa no capital social de outra empresa pode ser suficiente para atrair a responsabilidade solidária, mesmo que não haja prova de envolvimento direto nos atos ilícitos. Portanto, a diligência e a integridade devem permear todas as operações e relações dentro de um grupo, como medida preventiva e de conformidade com o rigor da Lei Anticorrupção. A evolução da jurisprudência (decisões dos tribunais), como demonstrado por este julgado, sinaliza um cenário jurídico cada vez mais exigente em matéria de integridade corporativa no Brasil.

Isso reforça a cautela que as empresas precisam ter com due diligences de outras empresas que pretendam adquirir ou se fundir, na medida em que atos cometidos em violação da Lei Anticorrupção poderão trazer um gosto amargo como herança pelo descuido de checagem adequada de riscos que precisam ser levados em consideração no momento da tomada de decisão. Com isso em mente, os serviços do Licks Attorneys para elaboração de tais due diligences podem poupar muito dinheiro e dor de cabeça aos seus sócios e administradores.

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Um dos temas mais relevantes e debatidos a respeito dessa legislação tem sido a extensão da responsabilidade, especialmente no se refere à solidariedade entre empresas integrantes de um mesmo grupo econômico.

Em 3 de junho desse ano, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou e consolidou o entendimento sobre a aplicação irrestrita da responsabilidade solidária prevista no art. 4º, § 2º, da referida lei. O julgamento, de grande relevância, eliminou quaisquer divergências de interpretação acerca dessa questão. Esse entendimento foi firmado por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 2.209.077-RS, de relatoria do Ministro Paulo Sérgio Domingues, cujos detalhes serão apresentados abaixo.

1. Contextualização do julgamento

O julgamento em questão da Primeira Turma do STJ teve como resultado um acórdão que consolidou a negativa de provimento ao Recurso Especial interposto por SUL CONCESSOES RODOVIARIAS S/A. Com efeito, a decisão confirmou a validade das disposições da Lei Anticorrupção relativas à responsabilidade solidária entre sociedades controladoras, controladas, coligadas e consorciadas, conforme expressamente declarado na ementa do julgado:

EMENTA “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 1.022 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 4º, § 2º, DA LEI ANTICORRUPÇÃO (LEI 12.846/2013). INTERPRETAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO NEGADO.”

A corte superior manteve, portanto, a tese de que a responsabilidade por atos lesivos à administração pública, no âmbito da Lei Anticorrupção, abrange de forma ampla as relações societárias. Isso visa impedir a blindagem patrimonial entre empresas de um mesmo grupo econômico e a evasão de responsabilização.

O cerne do Recurso Especial interposto por SUL CONCESSOES RODOVIARIAS S/A residia na alegação de violação ao art. 1.022, I, do Código de Processo Civil (CPC), por suposta obscuridade do acórdão recorrido do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) quanto à interpretação do art. 4º, § 2º, da Lei Anticorrupção. A recorrente sustentou que a responsabilidade solidária não deveria ser aplicada de forma ampla e irrestrita, argumentando que o caput do art. 4º da Lei Anticorrupção condicionaria a solidariedade à ocorrência de modificações societárias (como alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária).

A manifestação da recorrente é explicitada no relatório do voto: “Sustenta que houve ofensa ao art. 11, III, da Lei Complementar 95/1998 e ao art. 4º, § 2º, da Lei 12.846/2013, ao argumento de que a responsabilidade solidária não deve ser aplicada de forma ampla e irrestrita, pois o caput do art. 4º condiciona a solidariedade à ocorrência de modificações societárias.”

O STJ, contudo, rechaçou os argumentos da recorrente. Primeiramente, afastou a alegada violação ao art. 1.022 do CPC, asseverando que a prestação jurisdicional foi adequadamente entregue e o acórdão do TRF4 não padecia de vícios. Em relação ao mérito, o Tribunal enfatizou que a interpretação do art. 4º, § 2º, da Lei Anticorrupção deve ser teleológica, buscando efetivar o propósito da norma de evitar que pessoas jurídicas se esquivem de suas responsabilidades mediante artifícios legais ou reestruturações societárias.

2. Validação da interpretação do art. 4, § 2 da Lei Anticorrupção

A Lei nº 12.846/2013 prevê no seu art. 4º e no respectivo parágrafo segundo o seguinte:

Artigo Quarto e Parágrafo Segundo

Art. 4º Subsiste a responsabilidade da pessoa jurídica na hipótese de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária.

§ 2º As sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato, as consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei, restringindo-se tal responsabilidade à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado.

O STJ, corroborando o entendimento do TRF4, esclareceu que o caput do art. 4º não estabelece uma condição para a atribuição da responsabilidade solidária. Pelo contrário, o dispositivo visa garantir a continuidade da responsabilidade da pessoa jurídica mesmo diante de alterações societárias. Ou seja, a responsabilidade perdurará, ainda que ocorram transformações ou reorganizações empresariais, sem que estas sirvam como subterfúgio para eximir a entidade de suas obrigações.

A essência da interpretação do STJ reside na finalidade do § 2º do art. 4º, que é, segundo a Corte, a de “abranger o maior número de situações possíveis no âmbito da criação, da transformação, do agrupamento e da dissolução de empresas, impedindo, dessa forma, a ausência de responsabilização em decorrência de lacuna legislativa”. Tal entendimento busca, primordialmente, evitar que grupos econômicos se valham de suas complexas estruturas societárias para se furtar à responsabilização por atos ilícitos.

A referida decisão cita a doutrina a seguir: “Com o mesmo propósito já manifestado em outros artigos, a lei pretende aqui evitar que sejam excluídas de seu âmbito determinadas situações pela ausência de certas formalidades ou lacunas legais; no caso, a situação dos grupos econômicos.”  

O Tribunal de origem (TRF4), em trecho endossado pelo próprio STJ, foi ainda mais incisivo ao afirmar que: “Embora o caput e o §1º tratem de alterações promovidas na pessoa jurídica supervenientes ao estabelecimento de relação entre a sociedade privada e a Administração Pública, o §2º afirma, de maneira geral e ampla, que as sociedades controladoras, controladas, coligadas e consorciadas são responsáveis de forma solidária pelos atos previstos naquela lei. A intenção da norma é clara no sentido de evitar que os conglomerados empresariais furtem-se de responsabilidade.

Ademais, a decisão enfatiza que não importa a data de criação das pessoas jurídicas controladas ou coligadas, mas sim se os atos ilícitos ocorreram ou produziram efeitos durante a vigência da Lei Anticorrupção. Isso impede a proteção ad aeternum de empresas líderes de conglomerados que controlam pessoas jurídicas interpostas.

3. Implicações da decisão

A decisão do STJ tem implicações profundas para a responsabilidade corporativa. No caso concreto, o Tribunal manteve a inclusão de uma empresa com participação societária superior a 20% no capital social da concessionária — a qual era a responsável direta pelos atos lesivos — no polo passivo da ação embasada na Lei Anticorrupção. Esta inclusão se deu sob o fundamento de que a empresa se enquadrava na definição de “coligada” e, portanto, estava sujeita à responsabilidade solidária.

O acórdão do TRF4, ratificado pelo STJ, explicita a qualificação da empresa neste sentido: “Acerca do conceito de coligadas (…) E referido dispositivo caracteriza sociedade coligada aquela que é titular 10% (dez por cento) ou mais do capital da outra sociedade, sem controlá-la. No caso em apreço a agravante tem mais de 20% do capital social da concessionária.

Isso reforça que a simples existência de um vínculo societário significativo, nos moldes definidos pela legislação civil é suficiente para atrair a responsabilidade solidária na Lei Anticorrupção, independentemente da demonstração de que a empresa coligada tenha diretamente cometido ou contribuído para o cometimento dos ilícitos. Conforme o art. 1.099 do Código Civil, a coligação se caracteriza se houver participação de 10% ou mais do capital social. A lógica é que, ao integrar um conglomerado e ser beneficiada pelos atos, mesmo que de forma indireta, a empresa assume o risco inerente à associação.

Essa interpretação se alinha ao caráter objetivo da responsabilidade estabelecida pela Lei Anticorrupção e à sua finalidade de responsabilizar entidades que, embora não diretamente executoras do ato ilícito, integram um complexo societário que se beneficiou ou deveria ter evitado a prática lesiva. A tese de que a controladora ou coligada, por sua posição de proeminência, “concretamente contribuiu para o resultado final” ou “de alguma maneira foram beneficiadas por eventuais vantagens indevidas” é um fundamento importante, afastando a necessidade de uma participação direta no ato de corrupção em si, mas focando na responsabilidade pela gestão e benefícios do grupo como um todo.

Essa decisão é crucial por diversos motivos:

Combate à impunidade: Dificulta a utilização de reestruturações societárias e complexas teias empresariais para evadir a responsabilização por atos de corrupção.

Reforço da governança: Impõe um ônus maior às empresas que integram grupos econômicos, incentivando a implementação de programas de compliance robustos e mecanismos de due diligence eficazes em todas as suas filiadas e coligadas.

Alinhamento com a teleologia da lei: Garante que a finalidade da Lei Anticorrupção — que é a de responsabilizar objetivamente as pessoas jurídicas por atos lesivos contra a administração pública — seja plenamente atingida, sem lacunas que permitam escoimar-se à responsabilidade.

Para empresas que atuam em grupos econômicos, a mensagem é clara: a interconexão societária implica uma responsabilidade compartilhada. A simples participação significativa no capital social de outra empresa pode ser suficiente para atrair a responsabilidade solidária, mesmo que não haja prova de envolvimento direto nos atos ilícitos. Portanto, a diligência e a integridade devem permear todas as operações e relações dentro de um grupo, como medida preventiva e de conformidade com o rigor da Lei Anticorrupção. A evolução da jurisprudência (decisões dos tribunais), como demonstrado por este julgado, sinaliza um cenário jurídico cada vez mais exigente em matéria de integridade corporativa no Brasil.

Isso reforça a cautela que as empresas precisam ter com due diligences de outras empresas que pretendam adquirir ou se fundir, na medida em que atos cometidos em violação da Lei Anticorrupção poderão trazer um gosto amargo como herança pelo descuido de checagem adequada de riscos que precisam ser levados em consideração no momento da tomada de decisão. Com isso em mente, os serviços do Licks Attorneys para elaboração de tais due diligences podem poupar muito dinheiro e dor de cabeça aos seus sócios e administradores.

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